UNILASALLE
LEGISLAÇÃO AMBIENTAL E TRANSGÊNICOS
Beatriz Maria Strieder[1]
João Francisco da Costa[2]
Elaine Regina Oliveira dos Santos[3]
RESUMO: O desenvolvimento tecnológico demonstra seu potencial neste início de século, a Engenharia Genética está em seu clímax. A modificação das cadeias genéticas atingiu seu patamar mais temido: a manipulação pela humanidade. Os Organismos Geneticamente Modificados (OGM’s) e Alimentos Geneticamente Modificados (AGM’s), entram no cenário político brasileiro demonstrando força. A Legislação sobre a utilização, pesquisa e consumo desses elementos é apontada neste artigo, além de suas controversas decisões.
Palavras – Chave: Bioética – Trangênicos – Legislação -
ABSTRACT: The technological development demonstrates its potential in this century beginning, the Genetic Engineering is in its climax. The modification of the genetic chains reached its feared landing: the manipulation for the humanity. The Organisms Genetically Modified (OGM's) and Victuals Genetically Modified (AGM's), they enter in the scenery political Brazilian demonstrating it forces. The Legislation about the use, researches and consumption of those elements is aimed in this article, besides its controversial decisions.
Words - Key: Bioethics - Transgênics - Legislation
1. INTRODUÇÀO
“A terra será maldita por causa da tua obra. Ela te produzirá espinhos: e tu terás por sustento as ervas da terra. Tu comerás o teu pão no suor do teu rosto.” (Gênesis, 3: 17-19)
O presente trabalho tem por finalidade analisar as políticas estabelecidas ao uso e cultivo dos alimentos transgênicos; para isso, buscar-se-á compreensão sobre estes alimentos descrevendo suas origens, entendendo as preocupações existentes hoje, no âmbito das Leis, dos ambientalistas e da população em geral, que busca uma maior compreensão sobre o assunto.
O crescimento da população que quase duplicará nos próximos 50 anos, não exigirá apenas maior quantidade de alimentos, mas também uma grande expansão de áreas ocupadas com moradias, locais de trabalho, educação, lazer, etc. É imprescindível, portanto, um acentuado aumento na produtividade das culturas para que algumas regiões naturais possam continuar a serem protegidas.
Existe um consenso na comunidade científica mundial de que a tecnologia convencional sozinha não permitirá que a produção de alimentos seja aumentada o suficiente para alimentar uma população de 9.37 bilhões de pessoas, estimadas para o ano de 2050 (BONGAARTS, 1998).
Mesmo reconhecendo que o problema poderá ser minorado, em parte, com uma melhor distribuição dos alimentos, é importante salientar que para atender às necessidades futuras e permitir uma produção sustentável, a pesquisa agrícola deverá utilizar todas as tecnologias, incluindo as modernas biotecnologias, que vêm apresentando um desenvolvimento extremamente rápido. De particular importância é a engenharia genética, que envolve também a produção e uso de plantas transgênicas.
Todavia, se faz necessário analisar essas questões no âmbito legal, dentro de cada país onde esses OGM’s (Organismos Geneticamente Modificados) são produzidos e/ou comercializados.
Ainda, pelo menos no Brasil, pode considerar-se que a Legislação em relação a estas questões, está longe de atingir um patamar de entendimento entre os produtores, consumidores, defensores e agressores dos OGM`s.
2. A BIOÉTICA
Bioética é a ética da vida, tal como temos hoje, é um humanismo de novo tipo que surgiu e adquiriu a visibilidade como um movimento social de luta pela ética no campo das biociências, a partir da década de 1970. Hoje, a Bioética é também uma disciplina que busca vincular uma ciência crítica e tenta assegurar posturas éticas nas ações do cotidiano da área da saúde, com destaque às práticas médicas e nas experimentações científicas que utilizam seres humanos (OLIVEIRA, 2001)[4]
A Bioética é uma especialização da ética, que tem por objetivo a reflexão do avanço da Biotecnologia, frente às mudanças ocorridas nas ciências, no meio ambiente e as conseqüências destas sob os seres humanos e o planeta.
O objeto de atuação da Bioética surgiu com a tomada de consciência por parte do homem, de que ele é parte integrante e atuante do meio em que vive. Desta forma, suas intervenções devem ser pensadas e refletidas para que não seja vítima de suas próprias ações.
Em primeiro momento, a Bioética foi entendida como preservação do meio ambiente e da biodiversidade. Com o avanço da Biotecnologia houve a ampliação da utilização do termo para uma ética aplica às ciências biomédicas. A partir daí, surgiram os quatro princípios basilares da Bioética:
v Autonomia;
v Beneficência;
v Não maleficência;
v Justiça.
O princípio da autonomia revela-se como uma especificação dos direitos humanos, haja vista ter-se desenvolvido dos mesmos. Os princípios da beneficência e não maleficência referem-se diretamente aos profissionais da área da saúde, possuindo sua origem mais remota no juramento de Hipócrates, a qual ensina a atuar sempre para o bem do paciente e não para seu mal.
O princípio da justiça, o mais democrático, porém, o mais difícil de ser alcançado, garante o acesso de todos aos serviços de saúde. Sendo assim, faz-se necessário a conscientização da importância da Bioética e sua presença no cotidiano das pessoas.
3. O QUE SÃO OS TRANSGÊNICOS?
Há aproximadamente 40 anos, a Engenharia Genética começou a misturar genes de diferentes tipos de seres vivos sob a justificativa de associar algumas características supostamente desejáveis presentes em determinadas espécies e potencializar seu uso na produção de alimentos e na medicina.
Engenharia Genética é a atividade de manipulação de moléculas DNA/RNA recombinante. DNA/RNA.
Recombinante: são aquelas moléculas de material genético manipuladas fora das células vivas, mediante modificação de segmentos de DNA/RNA, natural ou sintético, que possam multiplicar-se em uma célula viva - ou ainda, as moléculas de DNA/RNA resultantes desta multiplicação.
Através da Engenharia genética temos a Modificação Genética que são técnicas que incluem DNA recombinante, introdução direta em um organismo de material hereditário de outra espécie - incluindo micro-injeção, micro-encapsulação, fusão celular e técnicas de hibridização- com formação de novas células ou novas combinações genéticas, de maneira que não ocorre naturalmente; já a gene inseticida: gene introduzido na planta para que ela passe a produzir substâncias de resistência a seus insetos predadores.
Os Transgênicos ou Organismos Geneticamente Modificados (OGM’s) são definidos como organismos que tenham sido alterados geneticamente por métodos ou meios que não ocorrem naturalmente.
Os Alimentos Geneticamente Modificados (AGM’s) são alimentos compostos contendo organismos geneticamente modificados ou derivados destes. São produtos criados em laboratórios com a utilização de genes de espécies diferentes de animais, vegetais ou micróbios.[5]
3.1 POSSÍVEIS RISCOS À SAUDE
· Aumento das alergias
· Desenvolvimento de resistência bacteriana com a conseqüente redução da eficácia de remédios à base de antibióticos...
· Potencialização dos efeitos de substâncias tóxicas: muitas plantas possuem substâncias tóxicas naturais para se defender de seus inimigos naturais; se manipulados geneticamente, os níveis dessas toxinas podem aumentar.
· Aumento de resíduos de agrotóxicos: alguns dos produtos transgênicos têm como característica se tornarem resistentes aos efeitos dos agrotóxicos (soja "roundup ready"), o que permite que seja aplicado mais veneno (agrotóxico) na plantação, cujos resíduos permanecerão nos alimentos e poluirão os rios e o solo.
3.2 TRANSGÊNICOS E MEIO AMBIENTE
Os impactos que podem vir a ocorrer com a liberação de organismos transgênicos no meio ambiente são inúmeros, devido à diversidade e peculiaridade de cada ecossistema; podemos citar alguns: Existe um enorme perigo que as plantas transgênicas cruzem com suas primas selvagens e, por possuírem dentro de si genes de outros organismos que lhes confere maior resistência, eliminem por competição (processo de seleção natural), outras plantas, acarretando assim numa perda de biodiversidade. Isto é extremamente factível de ocorrer nos chamados “centros de origem”, ou seja, nos locais em que as plantas se originaram. Um bom exemplo é o que pode ocorrer com o milho oriundo da América Central, onde há pelo menos 300 espécies diferentes, que poderiam ser extintas em virtude desta “poluição genética” Environmental Impacts of GMOs in Greenpeace Briefing 05/99.
Os transgênicos podem afetar os ecossistemas na medida que, junto com as pragas e ervas daninhas que buscam eliminar, também prejudicam populações benéficas à agricultura, como abelhas, pássaros, minhocas e outros animais ou espécies de plantas. Entomologistas (estudiosos de insetos) da Universidade de Cornell, EUA, mostraram que o pólen de milho transgênico mata as famosas borboletas monarca, que não prejudicam tais plantações. “Este resultado têm potencialmente implicações profundas para a conservação desta espécie” escreve Linda Raylor, coordenadora do estudo ( Folha de S.P., 20/05/99 p.1-15).
O Greenpeace e entomologistas da Universidade de Exeter também fizeram um levantamento de outras dezenas de espécies de borboletas e besouros que podem se expor aos efeitos tóxicos do milho Bt desenvolvido por todas as multinacionais do ramo.
Uma outra conseqüência negativa possível é que o uso intensivo de antibióticos e pesticidas Antibiotic Resistance in Genetically Modified Plants in Greenpeace Briefing, resultante desta tecnologia, torne as pragas, bactérias e vírus mais resistentes a essas substâncias. Uma vez estes organismos resistentes introduzidos no meio ambiente, seus danos são irreversíveis porque será impossível controla-los ou remove-los (PAOLI apud OLIVEIRA, 2003).[6]
Entre as possíveis conseqüências do cultivo dos transgênicos estão o empobrecimento da biodiversidade, visto que há risco das plantas geneticamente modificadas interagirem no meio ambiente com as variedades naturais.
Outra hipótese é a da eliminação de insetos e microorganismos benéficos ao equilíbrio ecológico, bem como a possibilidade de aumentar a contaminação dos solos e lençóis freáticos devido ao uso intensificado de agrotóxicos e ainda o desenvolvimento de plantas e animais resistentes a uma ampla gama de antibióticos e agrotóxicos. Pelo desconhecimento dos reais riscos dos transgênicos é preciso estabelecer normas rígidas de segurança. Por isto, as organizações públicas privadas, nacionais, estrangeiras ou internacionais, financiadoras ou patrocinadoras devem desenvolver pesquisas com organismos geneticamente modificados. O principal risco da disseminação dos cultivos transgênicos está na distância que há entre a complexidade dos seres vivos e o patamar alcançado pelo conhecimento científico.[7]
Não se pode falar em remover todas as plantas transgênicas do mercado pois elas têm certas vantagens, mas o fato de que as toxinas estão em material genético que pode se hibridizar para outras plantas tornando-as tóxicas para os insetos, é uma perspectiva verdadeiramente assustadora.
4. A TRANSGENIA NO BRASIL
As principais sociedades científicas brasileiras, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciência (ABC) têm se mostrado ponderadas em suas declarações dobre o tema, mas nunca se manifestaram contra os transgênicos efetivamente.
No Brasil a Lei 8.974 de janeiro de 1995, e o decreto 1752/95 estabelece as regras para as atividades com engenharia genética, incluindo os requisitos para o trabalho restrito a experimentação e para liberações ambientais de Organismos Geneticamente Modificados. Esta regulação possibilitou dar início a incorporação da Biotecnologia aos processo agrícolas no país. O sistema regulatório brasileiro se assemelha ao modelo europeu, por considerar o controle dessa tecnologia de forma distinta dos demais processos tecnológicos. Entretanto, no que diz respeito aos procedimentos de inspeção, o Brasil segue o modelo americano, onde cada autorização é seguida de verificação local, para segurar se as medidas de controle de riscos apresentadas pelo aplicante são cumpridas.
Desde sua designação em junho de 1996, a CTNBio autorizou cerca de 874 ensaios de campo com OGM’s, sendo a maioria desses ensaios com milho e soja. As principais características genéticas e agronômicas introduzidas nestas culturas são de resistências à herbicidas e de tolerância à insetos. O primeiro produto agrícola geneticamente modificado ao ter parecer favorável da CTNBio para comercialização foi a soja Round up Ready (RR), da Monsanto, em setembro de 1998.
Devemos analisar todas as questões possíveis sobre a utilização dos transgênicos, para podermos compreender as conseqüências ou não deste ao meio ambiente a população, para isso, devemos também questionar a questão ambiental, que poderá sofrer impactos profundos.
A existência de grande diversidade biológica no Brasil, o torna um potencial gerador de conhecimento e de produtos derivados do uso desta biodiversidade. Contudo, se faz necessário a implantação de um eficiente arcabouço legal que permita regulamentar as relações entre a pesquisa científica e o mercado, no escopo das atividades de prospecção da biodiversidade - bioprospecção.
Em termos gerais, a bioprospecção é a exploração da diversidade biológica por recursos genéticos e bioquímicos de valor comercial e que pode fazer uso do conhecimento de comunidades indígenas ou tradicionais. Esta atividade além de incluir atores oriundos do setor produtivo, inclui ainda aqueles oriundos de empresas de biotecnologia, de instituições de ensino e pesquisa, de comunidades indígenas e tradicionais e por fim, mas não menos importante, os diversos atores oriundos do governo.
No entanto, as atividades de bioprospecção expressam as especificidades estruturais dos países biologicamente ricos, a saber: o aparato jurídico-institucional para a conservação e uso sustentável da biodiversidade; a competência científico-tecnológica para o desenvolvimento de produtos a partir da biodiversidade; e a infra-estrutura para conservação in situ e ex situ desses recursos.
Embora existam esforços de algumas instituições de ensino e pesquisa, em parceria com laboratórios privados para a P,D&I, que possuem por objeto central o desenvolvimento de novos produtos ou a agregação de valor à diversidade biológica, tais empreendimentos poucos resultados lograram para disponibilizar ao mercado consumidor um novo produto, com incorporação de tecnologias de fronteiras. Via de regra, fazer P,D&I no país raramente está associado a empresas, o que torna tais atividades de difícil consecução. Essa situação está associada à dificuldade de, por um lado, a universidade passar os resultados de suas pesquisas para o setor produtivo e este, por sua vez, de buscar a competitividade por meio de pesquisa e desenvolvimento.
Além dessas dificuldades associadas à pesquisa no Brasil voltada ao uso econômico da biodiversidade, adiciona-se uma legislação complexa e de pouca repercussão, principalmente no escopo de uma atividade de bioprospecção para harmonizar assimetrias entre diferentes atores com interesses e vocações próprias, do ponto de vista da legalidade de suas ações e contratos.
Até o lançamento da Medida Provisória 2052 de 29 de junho de 2000 (atual MP 2186-16) a legislação brasileira tanto a que trata da proteção do meio ambiente, quanto aquelas leis e normas relacionadas a patentes, que poderiam cercar de maneira mais satisfatória a comercialização dos recursos biológicos do país, eram ineficientes no trato ao acesso aos recursos genéticos ou no incentivo ao desenvolvimento sustentável da biodiversidade brasileira.
Inexistia, até a edição da atual Medida Provisória, qualquer norma legal, específica com relação ao combate à biopirataria, e no ordenamento jurídico, quanto ao acesso e uso da diversidade biológica, exceção feita a alguns decretos e portarias que regulam a realização de expedições científicas por estrangeiros no território nacional, porém de curto alcance.
No entanto, depois da edição da Medida Provisória 2052 (atual MP 2186-16), devido à severidade das regras impostas, várias instituições internacionais suspenderam ou diminuíram suas atividades de P&D no Brasil, em função das ameaças levantadas pela referida MP. É no mínimo irônico que o Brasil, sendo um líder mundial em diversidade biológica, atravessando uma fase ascendente quanto à produção científica nessa área esteja ameaçado de ver tal esforço interrompido.
É evidente que as nações modernas não podem viver dentro de um horizonte liberal de circulação de informações sobre o patrimônio natural e genético, à medida que esse patrimônio é utilizado para fins comerciais e financeiros importantíssimos no mundo globalizado. É necessário que haja mecanismos de defesa sensíveis às condições da pesquisa autóctone que, não raro, inclui interação internacional, implicando na circulação de material biológico e genético.
Até que tal matéria se consubstancie em uma legislação consistente e aplicável, as atividades de bioprospecção estarão em um limbo, sempre à sombra da ilegalidade, sob a ameaça de serem consideradas como biopirataria, pondo em evidência e reforçando as assimetrias existentes entre os diferentes atores que poderiam ser minimizadas na existência de uma legislação condigna.
Serão necessárias medidas políticas que possam oportunizar consorciamentos entre os atores das esferas acadêmica e produtiva, bem como força política na Câmara dos Deputados, para que as imprecisões que tornam a atual Medida Provisória de difícil aplicação sejam sanadas por intermédio um substitutivo ao atual instrumento legal.
Por outro lado, o apoio à pesquisa científica realizada nas instituições de ensino e pesquisa e nas empresas deve continuar e ser fortalecido, bem como a implementação de instrumentos destinados à construção da cooperação e de parcerias entre os diferentes atores. Da mesma forma, capacitar recursos humanos e expandir a infraestrutura das instituições de ensino e pesquisa deve ser uma atividade contínua, assim como fortalecer aquelas instituições que atuam na conservação da biodiversidade, principalmente na conservação ex situ.
Nossos bancos de germoplasma, herbários, coleções de microorganismos, coleções zoológicas, dentre outros, devem ter um tratamento diferenciado, pois cabe a instituições que executam esses serviços de "arquivamento", a manutenção em longo prazo de nossa grande riqueza ainda a ser mais bem explorada economicamente, que é a biodiversidade. Cabem também a essas instituições responder por alguns dos itens especificados na MP, o referente ao "arquivamento" de uma amostra nos bancos e coleções nacionais. Para tanto se faz necessário a existência de pessoal qualificado, condições de conservação, manutenção de pesquisas neste tema, com a utilização das mais modernas técnicas para identificação, caracterização e conservação desses recursos, dentre outros aspectos.
Os itens apontados acima fazem parte de um rol de questões que ainda necessitam ser equacionadas para o tratamento adequado da matéria, que vão muito além dos aspectos legais. As atividades de bioprospeção no país, para que obtenham o sucesso adequado, terão que, necessariamente, ser desenvolvidas por meio de uma parceria entre os diversos atores. É isto que se espera no atual processo. [8]
4.1 LEGISLAÇÃO DOS TRANSGÊNICOS NO BRASIL
No Brasil, a Lei de Biossegurança nº8.974 de 5 de janeiro de 1995 (Anexo I), regulamentada através do Decreto nº1.752 de 20 de dezembro de 1995, estabelece e impõem condições de segurança para as pesquisas na área da Biotecnologia. A regulamentação da Lei de Biossegurança levou à criação de Comissão Técnica Nacional de Biossegurança - CTNBio. A CTNBio é composta por representantes do poder Executivo, da comunidade científica, do setor empresarial que atua em biotecnologia, de representantes dos órgãos de defesa do consumidor e de órgãos legalmente constituídos de proteção à saúde do trabalhador. Essa Comissão é responsável pela regulamentação da biossegurança no país, no que se refere ao uso e liberação de organismos geneticamente modificados - OGM’s - desde o laboratório até o meio ambiente.[9]
Além da CNTBio, o IDEC institucionalizou uma Lei em 1990, de identificação dos produtos adquiridos, o que neste caso, deveria ser respeitado:
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - LEI N.º 8.078 - 11.09.90
Capítulo III - Dos direitos básicos do consumidor
Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
Artigo 31 - A oferta e a apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, CLARAS, PRECISAS, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidade, quantidade, COMPOSIÇÃO, preço, garantia, prazo de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os RISCOS que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.[10]
Todavia, a questão da rotulagem poderia causar impacto aos consumidores, principalmente àqueles que não são favoráveis ao consumo e/ou produção dos mesmos:
"Informar no rótulo, que um alimento é transgênico, terminaria por assustar o consumidor, impedindo a compra ou consumo do produto". Defensores dos transgênicos se assustam com rótulos que, informando a transgenicidade, possam assustar e afastar consumidores. Eu, pessoalmente, me assusto com gente que, sem susto, se julga capaz de manipular o código genético, mas se confessa incapaz de persuadir consumidores sobre a inocuidade sanitária e ambiental desse ato, preferindo fazê-lo escondido." ( Luiz Eduardo Carvalho - Delegado do Governo Brasileiro no Codex Alimentarius Commission FAO/WHO
Ottawa, 05.98).[11]
Porém, as questões sobre os OGM’s vão além da rotulagens, pois muitas vezes o próprio produtor não informa que cultivou a semente transgênica, impossibilitando, a olhos nus, a comprovação dos mesmos, sendo necessários teste laboratoriais, que dependem de tempo e investimentos à sua realização.
Neste ano (2003), está ocorrendo uma verdadeira revolução no âmbito de enfrentamentos quanto à questão da produção/utilização dos OGM’s e AGM’s.
Nos últimos meses, acompanhando as reportagens existentes, pode-se analisar uma verdadeira guerra travada entre governo e produtores, ambientalistas e ministérios. Outrossim, o mais preocupante, é que enquanto tudo isso ocorre, enquanto as pesquisas não dão certezas sobre os malefícios ou não desses elementos, o meio ambiente e a população ficam sujeitas aos possíveis efeitos negativos causados por esses produtos, conforme coloca a Senadora Marina Lima, no projeto de Lei 216 de 1999 (Anexo II), quando cita Os riscos que podem sobrevir da transferência de genes na agricultura que podem ser de diversos tipos e que foram analisados, com muita propriedade, pela engenheira agrônoma Eliana C.B. Leite (revista Agroanalysis, Fundação Getúlio Vargas, junho de 1997) e pelo presidente do Instituto Nacional de Pesquisa Agronômica da França, Guy Paillotin (L’émergence des biotechnologies en agriculture, Futuribles, outubro de 1998):
– possibilidade de erosão genética dos agrossistemas dos países que abrigam os parentes silvestres dos cultivos agrícolas, ou seja, dos países onde estão localizados os centros de origem das espécies vegetais;
– transferência de genes das plantas tolerantes a herbicidas para espécies nativas aparentadas, com resultados imprevisíveis;
– desaparecimento de espécies silvestres e de variedades nativas, devido à maior agressividade das culturas transgênicas, o que acarretaria a redução da biodiversidade;
– eliminação de fungos e insetos benéficos por plantas modificadas para produção de fungicidas e inseticidas, bem como o surgimento de insetos resistentes às toxinas por elas produzidas;
– efeitos tóxicos e alergênicos, ou, ainda, a transferência de transgenes ou de genes marcadores para a flora digestiva.
A Legislação do Brasil ainda está, com certeza, longe de chegar a um termo mediador entre a “real proibição” do plantio e comercialização dos OGM’s.
Há poucos meses o Brasil observou a liberação da venda da safra 2003/2004, através da a Medida Provisória.
No caso específico do Rio Grande do Sul, onde existem projetos de Lei contra o plantio e comercialização destes Organismos deste 1999 (Anexo III), a Legislação parece novamente burlada, pois em sua maioria, os produtores cultivam sementes geneticamente modificadas sem autorização legal.
O fato é que as questões dobre o plantio, desenvolvimento de pesquisas e consumo de OGM’s e AGM’s, no que tange o Brasil, ainda é uma questões adversamente polêmica, a não certeza sobre os danos à saúde, ao meio ambiente preocupam e deixam dúvidas aos ambientalistas e a muitos cientistas.
Outra questão que pode ser levada em conta é a monopolização das patentes desses produtos, como em caso especial, a soja transgênica Round Ready, a qual pertence a patente a empresa Monsanto.
A retenção das patentes sempre foi um tema que deixava-se questionar, pois poderia algum dia ser cobrado pela utilização das semente transgênicas, pois bem, a questão durou, mas não tardou, pois conforme o Jornal Correio do Povo do dia 06 de novembro de 2003, A Monsanto do Brasil decidiu cobrar Royalties dos agricultores do Rio Grande do Sul que utilizem suas sementes nesta safra (2003/2004), alegando que os produtores haviam sido avisados ainda no mês de setembro, e a isto, nossa Legislação ainda não pronunciou-se.
O impasse ocasionado por todas essas questões ultrapassam a esfera do social, do natural, subjugado, vão além, tocam na esfera ética, na concepção moral de nossa sociedade. Até que ponto é válido (aos produtores do Rio Grande do Sul) festejarem a conquista da venda de suas safras, quando no entanto, irão prejudicar-se financeiramente em um futuro próximo?
As questões éticas e morais devem ser analisadas nesse campo, onde a legislação brasileira demonstrar seu caráter ainda frágil.
A este artigo ficam dúvidas claras sobre os OGM’s e AGM’s, sobre sua utilização, sobre a retenção de suas patentes, sobre seus possíveis impactos sobre o meio ambiente, enfim, sobre sua própria questão, ou seja, por que transgênicos? Onde entram em nossas vidas? E, principalmente, por que devem entrar e permanecer sem sermos consultados.
Estas questões, provavelmente deveriam ser respondidas por nossas leis, porém, ainda aguardamos.
5. CONCLUSÃO
A questão da transgenia no Brasil está evidentemente longe de chegar a uma regulamentação que proíba sua utilização, plantio e comercialização.
Os Organismos Geneticamente Modificados (OGM’s) são hoje, uma possível ameaça ao meio ambiente e à saúde de humanos e animais.
Os processos de manipulação genética devem ser analisados cuidadosamente, pois nós, seres humanos, ainda não conhecemos o real potencial da natureza.
Nesse mundo de incerteza, as Leis que regulamentam os transgênicos, pelo menos no Brasil, ainda pecam em diversas situações, como foi o caso da Medida Provisória 131/03, liberando o plantio e comercialização desses produtos.
Além disso, as discussões a nível científico se acirram dia-a-dia. As interpretações são as mais diversas.
A não conscientização da população a respeito do assunto causa ora pânico, ora defesa por parte desta. As discordância sobre o tema provocam uma certa confusão de entendimentos em todos os ramos da sociedade brasileira: cobranças de Royalties, plantio, não plantio, quebra de Leis, enfim, um emaranhado de situações obscuras ainda.
Todavia, devemos procurar maiores esclarecimentos sobre o assunto, para que haja um despertamento sobre este, se é prejudicial ou não, ao que e a quem: a nós, aos agricultores ou as empresas que retém as patentes desses organismos.
6. BIBLIOGRAFIA
ASSAD, Ana L. e SANT’ANA, Paulo J. P. Revista COMCIENCIA, disponível on line: http://wwwcomciencia.br/reportagens/genetico/gen12.shtml, acessado em 25/10/2003
BONGAARTS, J. Global Populations Grown: Demographiv consequences of declining fertility. Science, 1998.
DREW, David. Processos interativos Homem – Meio ambiente. São Paulo: Difel, 1996.
INSTITUTO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Lei 8.078/90. Disponível on line: http://www.consumidores.hpg.ig.com.br/reclames/decon_idec.html, acessado em 05/10/2003
LEGISLAÇÃO. Leis Diversas. Disponível on line: http://www.ufrgs/HCPA/gppg/lei8974.htm, http://www.ufrgs/HCPA/gppg/lei216/99.htm, acessado em 26/10/2003
OLIVEIRA, Fátima. Bioética. Disponível on line: http://www.anbio.org.br/bio/biodir_art2.html, acessado em 31/10/2003
OLIVEIRA, Romildo. Disponível on line: http:// www.ufv.br/dbg/BIO240/t02.htm, acessado em 10/10/2003.
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ANEXO I
LEI 8. .974, de 05 de Janeiro de 1995
Regulamenta os incisos II e V do parágrafo 1º do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas para o uso das técnicas de engenharia genética e liberação no meio ambiente de organismos geneticamente modificados, autoriza o Poder Executivo a criar, no âmbito da Presidência da República, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º- Esta Lei estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização no uso das técnicas de engenharia genética na construção, cultivo, manipulação, transporte, comercialização, consumo, liberação e descarte de organismo geneticamente modificado (OGM), visando proteger a vida e a saúde do Homem, dos animais e das plantas, bem como o meio ambiente.
Art. 2º- As atividades e projetos, inclusive os de ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico e de produção industrial que envolvam OGM no território brasileiro, ficam restritas ao âmbito de entidades de direito público ou privado, que serão tidas como responsáveis pela obediência aos preceitos desta Lei e de sua regulamentação, bem como pelos eventuais efeitos ou conseqüências advindas de seu descumprimento.
§ 1º- Para os fins desta Lei consideram-se atividades e projetos no âmbito de entidades como sendo aqueles conduzidos em instalações próprias ou os desenvolvidos alhures sob a sua responsabilidade técnica ou científica.
§ 2º- As atividades e projetos de que trata este artigo são vedados a pessoas físicas enquanto agentes autônomos independentes, mesmo que mantenham vínculo empregatício ou qualquer outro com pessoas jurídicas.
§ 3º- As organizações públicas e privadas, nacionais, estrangeiras ou internacionais, financiadoras ou patrocinadoras de atividades ou de projetos referidos neste artigo, deverão certificar-se da idoneidade técnico-científica e da plena adesão dos entes financiados, patrocinados, conveniados ou contratados às normas e mecanismos de salvaguarda previstos nesta Lei, para o que deverão exigir a apresentação do Certificado de Qualidade em Biossegurança de que trata o art. 6º, inciso XIX, sob pena de se tornarem co-responsáveis pelos eventuais efeitos advindos de seu descumprimento.
Art. 3º- Para os efeitos desta Lei, define-se:
I - organismo - toda entidade biológica capaz de reproduzir e/ou de transferir material genético, incluindo vírus, prions e outras classes que venham a ser conhecidas;
II - ácido desoxirribonucléico (ADN), ácido ribonucléico (ARN) - material genético que contém
informações determinantes dos caracteres hereditários transmissíveis à descendência;
III - moléculas de ADN/ARN recombinante - aquelas manipuladas fora das células vivas, mediante a modificação de segmentos de ADN/ARN natural ou sintético que possam multiplicar-se em uma célula viva, ou ainda, as moléculas de ADN/ARN resultantes dessa multiplicação. Consideram-se, ainda, os segmentos de ADN/ARN sintéticos equivalentes aos de ADN/ARN natural;
informações determinantes dos caracteres hereditários transmissíveis à descendência;
III - moléculas de ADN/ARN recombinante - aquelas manipuladas fora das células vivas, mediante a modificação de segmentos de ADN/ARN natural ou sintético que possam multiplicar-se em uma célula viva, ou ainda, as moléculas de ADN/ARN resultantes dessa multiplicação. Consideram-se, ainda, os segmentos de ADN/ARN sintéticos equivalentes aos de ADN/ARN natural;
IV - organismo geneticamente modificado (OGM) - organismo cujo material genético (ADN/ARN) tenha sido modificado por qualquer técnica de engenharia genética;
V - engenharia genética - atividade de manipulação de moléculas ADN/ARN recombinante.
Parágrafo único. Não são considerados como OGM aqueles resultantes de técnicas que impliquem a introdução direta, num organismo, de material hereditário, desde que não envolvam a utilização de moléculas de ADN/ARN recombinante ou OGM, tais como: fecundação in vitro, conjugação, transdução, transformação, indução poliplóide e qualquer outro processo natural;
V - engenharia genética - atividade de manipulação de moléculas ADN/ARN recombinante.
Parágrafo único. Não são considerados como OGM aqueles resultantes de técnicas que impliquem a introdução direta, num organismo, de material hereditário, desde que não envolvam a utilização de moléculas de ADN/ARN recombinante ou OGM, tais como: fecundação in vitro, conjugação, transdução, transformação, indução poliplóide e qualquer outro processo natural;
Art. 4º- Esta Lei não se aplica quando a modificação genética for obtida através das seguintes
técnicas, desde que não impliquem a utilização de OGM como receptor ou doador:
I - mutagênese;
técnicas, desde que não impliquem a utilização de OGM como receptor ou doador:
I - mutagênese;
II - formação e utilização de células somáticas de hibridoma animal;
III - fusão celular, inclusive a de protoplasma, de células vegetais, que possa ser produzida mediante métodos tradicionais de cultivo;
IV - autoclonagem de organismos não-patogênicos que se processe de maneira natural.
Art. 5º- (VETADO)
Art. 5º- (VETADO)
Art. 6º- (VETADO)
Art. 7º- Caberá, dentre outras atribuições, aos órgãos de fiscalização do Ministério da Saúde, do Ministério da Agricultura, do Abastecimento e da Reforma Agrária e do Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia Legal, dentro do campo de suas competências, observado o parecer técnico conclusivo da CTNBio e os mecanismos estabelecidos na regulamentação desta Lei:
I - (VETADO)
II - a fiscalização e a monitorização de todas as atividades e projetos relacionados a OGM do Grupo II;
III - a emissão do registro de produtos contendo OGM ou derivados de OGM a serem
comercializados para uso humano, animal ou em plantas, ou para a liberação no meio ambiente;
IV - a expedição de autorização para o funcionamento de laboratório, instituição ou empresa que desenvolverá atividades relacionadas a OGM;
V - a emissão de autorização para a entrada no País de qualquer produto contendo OGM ou derivado de OGM;
III - a emissão do registro de produtos contendo OGM ou derivados de OGM a serem
comercializados para uso humano, animal ou em plantas, ou para a liberação no meio ambiente;
IV - a expedição de autorização para o funcionamento de laboratório, instituição ou empresa que desenvolverá atividades relacionadas a OGM;
V - a emissão de autorização para a entrada no País de qualquer produto contendo OGM ou derivado de OGM;
VI - manter cadastro de todas as Instituições e profissionais que realizem atividades e projetos relacionados a OGM no território nacional;
VII - encaminhar à CTNBio, para emissão de parecer técnico, todos os processos relativos a projetos e atividades que envolvam OGM;
VIII - encaminhar para publicação no Diário Oficial da União resultado dos processos que lhe forem submetidos a julgamento, bem como a conclusão do parecer técnico;
IX - aplicar as penalidades de que trata esta Lei nos artigos 11 e 12.
IX - aplicar as penalidades de que trata esta Lei nos artigos 11 e 12.
Art. 8º- É vedado, nas atividades relacionadas a OGM:
I - qualquer manipulação genética de organismos vivos ou o manejo in vitro de ADN/ARN natural ou recombinante, realizados em desacordo com as normas previstas nesta Lei:
II - a manipulação genética de células germinais humanas;
III - a intervenção em material genético humano in vivo, exceto para o tratamento de defeitos genéticos, respeitando-se princípios éticos tais como o princípio de autonomia e o princípio de beneficência,de acordo com o art. 6º, inciso IV, e com a aprovação prévia da CTNBio;
IV - a produção, armazenamento ou manipulação de embriões humanos destinados a servir como material biológico disponível;
V - a intervenção in vivo em material genético de animais, excetuados os casos em que tais intervenções se constituam em avanços significativos na pesquisa científica e no desenvolvimento tecnológico, respeitando-se princípios éticos, tais como o princípio da responsabilidade e o princípio da prudência, e com aprovação prévia da CTNBio;
VI - a liberação ou o descarte no meio ambiente de OGM em desacordo com as normas
estabelecidas pela CTNBio e constantes na regulamentação desta Lei.
VI - a liberação ou o descarte no meio ambiente de OGM em desacordo com as normas
estabelecidas pela CTNBio e constantes na regulamentação desta Lei.
§ 1º- Os produtos contendo OGM, destinados à comercialização ou industrialização, provenientes de outros países, só poderão ser introduzidos no Brasil após o parecer prévio conclusivo da CTNBio e a autorização do órgão de fiscalização competente, levando-se em consideração pareceres técnicos de outros países, quando disponíveis.
§ 2º- Os produtos contendo OGM, pertencentes ao Grupo II conforme definido no Anexo I desta Lei, só poderão ser introduzidos no Brasil após o parecer prévio conclusivo da CTNBio e a autorização do órgão de fiscalização competente.
§ 3º- (VETADO)
§ 2º- Os produtos contendo OGM, pertencentes ao Grupo II conforme definido no Anexo I desta Lei, só poderão ser introduzidos no Brasil após o parecer prévio conclusivo da CTNBio e a autorização do órgão de fiscalização competente.
§ 3º- (VETADO)
Art. 9º- Toda entidade que utilizar técnicas e métodos de engenharia genética deverá criar uma Comissão Interna de Biossegurança (CIBio), além de indicar um técnico principal responsável por cada projeto específico.
Art. 10º- Compete à Comissão Interna de Biossegurança (CIBio) no âmbito de sua Instituição:
I - manter informados os trabalhadores, de qualquer pessoa e a coletividade, quando suscetíveis de serem afetados pela atividade, sobre todas as questões relacionadas com a saúde e a segurança, bem como sobre os procedimentos em caso de acidentes;
II - estabelecer programas preventivos e de inspeção para garantir o funcionamento das instalações sob sua responsabilidade, dentro dos padrões e normas de biossegurança, definidos pela CTNBio na regulamentação desta Lei;
III - encaminhar à CTNBio os documentos cuja relação será estabelecida na regulamentação desta Lei, visando a sua análise e a autorização do órgão competente quando for o caso;
IV - manter registro do acompanhamento individual de cada atividade ou projeto em desenvolvimento envolvendo OGM;
V - notificar à CTNBio, às autoridades de Saúde Pública e às entidades de trabalhadores, o resultado de avaliações de risco a que estão submetidas as pessoas expostas, bem como qualquer acidente ou incidente que possa provocar a disseminação de agente biológico;
VI - investigar a ocorrência de acidentes e as enfermidades possivelmente relacionados a OGM, notificando suas conclusões e providências à CTNBio.
Art. 11º- Constitui infração, para os efeitos desta Lei, toda ação ou omissão que importe na inobservância de preceitos nela estabelecidos, com exceção dos parágrafos 1º e 2º e dos incisos de II a VI do art. 8º, ou na desobediência às determinações de caráter normativo dos órgãos ou das autoridades administrativas competentes.
Art. 12º- Fica a CTNBio autorizada a definir valores de multas a partir de 16.110,80 UFIR, a serem aplicadas pelos órgãos de fiscalização referidos no art. 7º, proporcionalmente ao dano direto ou indireto, nas seguintes infrações:
I - não obedecer às normas e aos padrões de biossegurança vigentes;
II - implementar projeto sem providenciar o prévio cadastramento da entidade dedicada à pesquisa e manipulação de OGM, e de seu responsável técnico, bem como da CTNBio;
III - liberar no meio ambiente qualquer OGM sem aguardar sua prévia aprovação, mediante publicação no Diário Oficial da União;
IV - operar os laboratórios que manipulam OGM sem observar as normas de biossegurança estabelecidas na regulamentação desta Lei;
V - não investigar, ou fazê-lo de forma incompleta, os acidentes ocorridos no curso de pesquisas e projetos na área de engenharia genética, ou não enviar relatório respectivo à autoridade competente no prazo máximo de 5 (cinco) dias a contar da data de transcorrido o evento;
VI - implementar projeto sem manter registro de seu acompanhamento individual;
VII - deixar de notificar, ou fazê-lo de forma não imediata, à CTNBio, e às autoridades da Saúde Pública, sobre acidente que possa provocar a disseminação de OGM;
VIII - não adotar os meios necessários à plena informação da CTNBio, das autoridades da Saúde Pública, da coletividade, e dos demais empregados da instituição ou empresa, sobre os riscos a que estão submetidos, bem como os procedimentos a serem tomados, no caso de acidentes;
IX - qualquer manipulação genética de organismo vivo ou manejo in vitro de ADN/ARN natural ou recombinante, realizados em desacordo com as normas previstas nesta Lei e na sua regulamentação.
§ 1º- No caso de reincidência, a multa será aplicada em dobro.
§ 2º- No caso de infração continuada, caracterizada pela permanência da ação ou omissão inicialmente punida, será a respectiva penalidade aplicada diariamente até cessar sua causa, sem prejuízo da autoridade competente, podendo paralisar a atividade imediatamente e/ou interditar o laboratório ou a instituição ou empresa responsável.
Art. 13º- Constituem crimes:
I - a manipulação genética de células germinais humanas;
II - a intervenção em material genético humano in vivo, exceto para o tratamento de defeitos genéticos, respeitando-se princípios éticos tais como o princípio de autonomia e o princípio de beneficência, e com a aprovação prévia da CTNBio;
Pena - detenção de três meses a um ano.
§ 1º- Se resultar em:
a) incapacidade para as ocupações habituais por mais de trinta dias;
b) perigo de vida;
c) debilidade permanente de membro, sentido ou função;
d) aceleração de parto;
Pena - reclusão de um a cinco anos.
§ 2º- Se resultar em:
§ 2º- Se resultar em:
a) incapacidade permanente para o trabalho;
b) enfermidade incurável;
c) perda ou inutilização de membro, sentido ou função;
d) deformidade permanente;
e) aborto;
Pena - reclusão de dois a oito anos.
§ 3º- Se resultar em morte;
Pena - reclusão de seis a vinte anos.
III - a produção, armazenamento ou manipulação de embriões humanos destinados a servirem como material biológico disponível;
Pena - reclusão de seis a vinte anos.
IV - a intervenção in vivo em material genético de animais, excetuados os casos em que tais intervenções se constituam em avanços significativos na pesquisa científica e no desenvolvimento tecnológico, respeitando-se princípios éticos, tais como o princípio da responsabilidade e o princípio da prudência, e com aprovação prévia da CTNBio;
Pena - reclusão de três meses a um ano.
V - a liberação ou o descarte no meio ambiente de OGM em desacordo com as normas
estabelecidas pela CTNBio e constantes na regulamentação desta Lei.
Pena - reclusão de um a três anos.
§ 1º- Se resultar em:
a) lesões corporais leves;
b) perigo de vida;
c) debilidade permanente de membro, sentido ou função;
d) aceleração de parto;
e) dano à propriedade alheia;
f) dano ao meio ambiente;
Pena - reclusão de dois a cinco anos.
§ 2º- Se resultar em:
a) incapacidade permanente para o trabalho;
b) enfermidade incurável;
c) perda ou inutilização de membro, sentido ou função;
d) deformidade permanente;
e) aborto;
f) inutilização da propriedade alheia;
g) dano grave ao meio ambiente;
Pena - reclusão de dois a oito anos;
§ 3º- Se resultar em morte;
Pena - reclusão de seis a vinte anos.
§ 4º- Se a liberação, o descarte no meio ambiente ou a introdução no meio de OGM for culposo:
Pena - reclusão de um a dois anos.
§ 5º- Se a liberação, o descarte no meio ambiente ou a introdução no País de OGM for culposa, a pena será aumentada de um terço se o crime resultar de inobservância de regra técnica de profissão.
§ 6º- O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de
responsabilidade civil e criminal por danos causados ao homem, aos animais, às plantas e ao meioambiente, em face do descumprimento desta Lei.
Art. 14º- Sem obstar a aplicação das penas previstas nesta Lei, é o autor obrigado,
independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade.
Disposições Gerais e Transitórias
Art. 15º- Esta Lei será regulamentada no prazo de 90 (noventa) dias a contar da data de sua publicação.
Art. 16º- As entidades que estiverem desenvolvendo atividades reguladas por esta Lei na data de sua publicação, deverão adequar-se às suas disposições no prazo de cento e vinte dias, contados da publicação do decreto que a regulamentar, bem como apresentar relatório circunstanciado dos produtos existentes, pesquisas ou projetos em andamento envolvendo OGM.
Parágrafo único. Verificada a existência de riscos graves para a saúde do homem ou dos animais, para as plantas ou para o meio ambiente, a CTNBio determinará a paralisação imediata da atividade.
Art. 17º- Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 18º- Revogam-se as disposições em contrário.
Brasília, 5 de janeiro de 1995; 174º da Independência e 107º da República
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
Nelson Jobim
José Eduardo De Andrade Vieira
Paulo Renato Souza
Adib Jatene
José Israel Vargas
Gustavo Krause
ANEXO I (da Lei 8.974/95)
Para efeitos desta Lei, os organismos geneticamente modificados classificam-se da seguinte maneira:
Grupo I: compreendem os organismos que preenchem os seguintes critérios:
A. Organismo receptor ou parental
- não-patogênico;
- isento de agentes adventícios;
- com amplo histórico documentado de utilização segura, ou a incorporação de barreiras biológicas que, sem interferir no crescimento ótimo em reator ou fermentador, permita uma sobrevivência e multiplicação limitadas, sem efeitos negativos para o meio ambiente.
B. Vetor/inserto
- deve ser adequadamente caracterizado e desprovido de seqüências nocivas conhecidas;
- deve ser de tamanho limitado, no que for possível, às seqüências genéticas necessárias para realizar a função projetada;
- não deve incrementar a estabilidade do organismo modificado no meio ambiente;
- deve ser escassamente mobilizável;
- não deve transmitir nenhum marcador de resistência a organismos que, de acordo com os conhecimentos disponíveis, não o adquira de forma natural.
C. Organismos geneticamente modificados:
- não-patogênicos;
- que ofereçam a mesma segurança que o organismo receptor ou parental no reator ou fermentador, mas com sobrevivência e/ou multiplicação limitadas, sem efeitos negativos para o meio ambiente.
D. Outros organismos geneticamente modificados que poderiam incluir-se no Grupo I, desde que eúnam as condições estipuladas no item C anterior:
- microorganismos construídos inteiramente a partir de um único receptor procariótico (incluindo plasmídeos e vírus endógenos) ou de um único receptor eucariótico (incluindo seus cloroplastos, mitocôndrias e plasmídeos, mas excluindo os vírus) e organismos compostos inteiramente por seqüências genéticas de diferentes espécies que troquem tais seqüências mediante processos fisiológicos conhecidos.
Grupo II: todos aqueles não incluídos no Grupo I.
Publicada no D.O.U. de 06.01.95, seção I, pág. 337.
ANEXO II
PROJETO DE LEI DO SENADO N.º 216, DE 1999,
Proíbe, por cinco anos, o plantio e a comercialização de alimentos contendo organismo geneticamente modificado (OGM) ou derivados de OGM, em todo o território nacional.
O CONGRESSO NACIONAL decreta:
Art. 1º Fica proibido, em todo o território nacional, o cultivo de organismos geneticamente modificados, bem como a importação, a exportação e a comercialização, para o consumo humano e animal, de alimentos contendo OGM ou derivados de OGM, por um período de cinco anos a contar da vigência desta Lei.
§ 1º Adotam-se para os fins desta Lei as definições contidas na Lei nº 8.974, de 5 de janeiro de 1995.
§ 2º A proibição de que trata o caput deste artigo não abrange o cultivo experimental de organismo geneticamente modificado para fins de avaliação de biossegurança.
§ 3º O cultivo experimental só poderá ser realizado por entidades dedicadas à pesquisa e à manipulação de organismo geneticamente modificado que tenham instituído a Comissão Interna de Biossegurança (CIBio), de que trata o art. 9º da Lei nº 8.974, de 1995, e estiverem de posse do Certificado de Qualidade em Biossegurança (CQB), previsto no art. 3º da Lei nº 8.974, de 1995, referente à entidade e à instalação ou área física onde o cultivo experimental será realizado.
Art. 2º Sem prejuízo das sanções previstas na Lei nº 8.974, de 1995, a inobservância da proibição imposta no art. 1º desta Lei acarretará:
I – interdição imediata da atividade;
II – apreensão e destruição dos produtos cultivados, importados ou comercializados.
Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
JUSTIFICAÇÃO
Tivemos a oportunidade de apresentar, na ultima legislatura, o Projeto de Lei do Senado nº 084, de 1997, com o objetivo de estabelecer uma moratória, em todo o território nacional, do plantio, comércio e consumo de organismos geneticamente modificado (OGMs) e produtos derivados. Essa proibição vigoraria até que estudos mais aprofundados atestassem os reais efeitos dos OGMs, ou organismos transgênicos, sobre a saúde e o meio ambiente. Uma série de fatores, no entanto, dificultou a apreciação dessa proposição no decorrer da legislatura finda, o que determinou o seu arquivamento.
Decidimos reapresentar a matéria tendo em vista que o tema desperta cada vez mais controvérsias. Não só em virtude do recente e polêmico parecer da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), que aprovou o primeiro pedido de plantio comercial da soja transgênica Roundup Ready (RR) – desenvolvida pela Monsanto para expressar tolerância ao herbicida Roundup, produzido pela própria multinacional –, como também devido à persistente falta de dados, na literatura especializada, que comprovem serem os alimentos transgênicos inofensivos à saúde e ao meio ambiente.
Embora as pesquisas no campo da engenharia genética tenham começado há cerca de duas décadas, só mais recentemente a produção em larga escala de OGMs tomou impulso, o que reacendeu a discussão, principalmente no âmbito internacional, sobre a segurança dos organismos transgênicos.
Vários cientistas, apoiados por entidades ambientalistas e de defesa do consumidor, continuam apreensivos quanto à liberação comercial dos cultivos transgênicos, e produtos derivados, sem que sejam adequadamente analisadas as conseqüências a longo prazo das manipulações genéticas. Segundo os especialistas, o processo não é totalmente controlado, e ainda há muito a conhecer na área da expressão gênica. A alteração de um gene do organismo, sem que se saiba previamente a função de todos os outros genes, poderá causar mudanças em mais de uma característica desse organismo, levando ao aparecimento de atributos indesejáveis.
Os riscos que podem sobrevir da transferência de genes na agricultura são de diversos tipos e foram analisados, com muita propriedade, pela engenheira agrônoma Eliana C.B. Leite (revista Agroanalysis, Fundação Getúlio Vargas, junho de 1997) e pelo presidente do Instituto Nacional de Pesquisa Agronômica da França, Guy Paillotin (L’émergence des biotechnologies en agriculture, Futuribles, outubro de 1998):
– transferência de genes das plantas tolerantes a herbicidas para espécies nativas aparentadas, com resultados imprevisíveis;
– desaparecimento de espécies silvestres e de variedades nativas, devido à maior agressividade das culturas transgênicas, o que acarretaria a redução da biodiversidade;
– possibilidade de erosão genética dos agrossistemas dos países que abrigam os parentes silvestres dos cultivos agrícolas, ou seja, dos países onde estão localizados os centros de origem das espécies vegetais;
– eliminação de fungos e insetos benéficos por plantas modificadas para produção de fungicidas e inseticidas, bem como o surgimento de insetos resistentes às toxinas por elas produzidas;
– efeitos tóxicos e alergênicos, ou, ainda, a transferência de transgenes ou de genes marcadores para a flora digestiva.
Com efeito, cresce a preocupação com genes que conferem resistência a antibióticos e que são usados como marcadores genéticos para evidenciar se o transgene de fato foi implantado no organismo no qual se deseja a modificação, para detectar se o transgene “pegou”. Quais serão as conseqüências na hipótese desses genes marcadores se transferirem para bactérias que vivem no organismo humano?
No rastro dessas incertezas, surgem agora os resultados das pesquisas realizadas pelo Dr. Arpad Pusztai – do Rowett Institute de Aberdeen, Escócia – com ratos alimentados com batatas transgênicas. Os dados obtidos ainda no ano passado, mas só agora de domínio público, relatam que as cobaias apresentaram alterações no sistema imunológico e em vários órgãos vitais. Esse trabalho recebeu o endosso de um respeitável grupo de cientistas de vários países e causou um rebuliço no mercado dos transgênicos. Apesar de o próprio cientista não considerar sua experiência uma prova final, está evidente que muito ainda há que pesquisar antes de podermos aceitar, com segurança, os alimentos transgênicos.
A par dos potenciais riscos ambientais e para a saúde, outros aspectos causam igualmente apreensão: a crescente dependência dos agricultores em relação aos insumos (pacote semente-herbicida), o monopólio das companhias que comercializam sementes, o aumento do fosso entre os países desenvolvidos e os em desenvolvimento, a pressão para o patenteamento dos seres vivos e a privatização de recursos genéticos são algumas questões que requerem uma reflexão mais aprofundada.
Outro fato preocupante diz respeito ao açodamento com que a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) está aprovando as solicitações para a liberação de OGMs no País. Uma análise mais acurada do processo de aprovação do plantio comercial da soja Roundup Ready lança suspeitas sobre a atuação dessa Comissão – por exemplo: não há informações sobre o comportamento e característica das cultivares de soja RR plantadas nas diferentes condições ambientais nacionais; os testes realizados trataram basicamente de questões agronômicas e não de questões de segurança ambiental; não foram abordados aspectos relevantes para a biossegurança de linhagens transgênicas. Por esses fatos, a decisão da CTNBio foi, no mínimo, precipitada
As empresas de biotecnologia, por sua vez, buscam associar os cultivos transgênicos a um novo paradigma agrícola, capaz de resolver os problemas mundiais de alimentação e saúde. A sociedade, no entanto, já começa a perceber que a pressão e a urgência para a introdução dos cultivos geneticamente modificados nada têm a ver com a solução da fome e da pobreza dos países do Terceiro Mundo, nem com a proteção ambiental; mas sim com o retorno imediato dos vultuosos investimentos feitos por essas grandes companhias, prevalecendo, então, os interesses comerciais.
A resposta final com relação à conveniência ou não de se consumir alimentos transgênicos deve ser precedida de um amplo debate, que envolva os diversos segmentos da sociedade brasileira, inclusive a comunidade científica, não podendo prevalecer como posição nacional somente o entendimento das empresas de biotecnologia e de determinados setores governamentais
A forte reação negativa dos consumidores internacionais, sobretudo os europeus, aos alimentos modificados tem levado seus países a adotar medidas as mais diversas: desde a obrigatoriedade de rotulagem de advertência nas embalagens dos produtos alterados geneticamente até a proibição do plantio comercial, da importação e do consumo de alimentos contendo OGMs e derivados. Recentemente, cientistas que integram o Painel de Desenvolvimento Sustentável da Grã-Bretanha pediram, em seu relatório anual, a moratória do comércio dos transgênicos até que se ampliem as pesquisas.
O Rio Grande do Sul pretende ser o primeiro estado brasileiro livre de transgênicos. Nesse sentido, tramita na Assembléia Legislativa projeto de lei apresentado pelo deputado Elvino Bohn Gass, que proíbe o cultivo comercial e a venda de produtos geneticamente modificados destinados à alimentação humana e de animais. Essa iniciativa foi acompanhada pelo Deputado Carlos Minc no Legislativo do Estado do Rio de Janeiro, que propôs matéria de idêntico teor. Além dos temores com as conseqüências que possam ter sobre o meio ambiente e a saúde, os gaúchos possuem fortes razões econômicas para banir os OGMs. O mercado europeu, cada vez mais avesso ao consumo dos alimentos geneticamente modificados, é o maior comprador da soja convencional plantada no Rio Grande do Sul. Vale lembrar que, entre os maiores produtores mundiais dessa leguminosa – Argentina, Brasil e Estados Unidos –, só o Brasil ainda não cultiva comercialmente a soja transgênica.
Apesar de não existirem provas conclusivas de que alimentos manipulados geneticamente façam mal, também não há evidências sólidas de que sejam totalmente inócuos. A verdade é que no momento atual não dispomos de um conjunto de dados consistentes acerca da segurança dos OGMs.
A cautela é necessária. Os fatos nos levam a aplicar o consagrado princípio da precaução – na dúvida, adotam-se medidas preventivas para evitar possíveis danos – e exigir uma moratória imediata da liberação dos alimentos geneticamente modificados.
Entendemos oportuno o prazo fixado para a vigência desta moratória no sentido de possibilitar tanto o desenvolvimento de avaliações técnico-científicas conclusivas sobre os impactos potenciais dos OGMs como o reexame futuro da matéria.
Pelas razões expostas, confiamos no acolhimento, pelos nobres colegas, do Projeto de Lei que ora lhes apresentamos.
Sala das Sessões, em 07 de abril de 1999.
Senadora MARINA SILVA
ANEXO III
PROJETO DE LEI N° 016/99
Veda o cultivo comercial de organismos geneticamente modificados (OGMs) no Estado do Rio Grande do Sul e dá outras providências.
Art. 1º - É vedado o cultivo comercial de organismos geneticamente modificados (OGMs) no Estado do Rio Grande do Sul.
Parágrafo único - Para os efeitos desta lei considera-se a definição de OGM expressa no artigo 3º e 4º da Lei Federal 8.974 de 5 de janeiro de 1995.
Art. 2º - É vedada a comercialização de produtos que contenham em sua composição substâncias provenientes de organismos geneticamente modificados que tenham como finalidade a alimentação humana ou animal.
Art. 3º - As empresas que desenvolvem ou venham a desenvolver pesquisas com organismos geneticamente modificados no Rio Grande do Sul deverão relatar suas atividades nos termos da Lei 9.453, de 10 de dezembro de 1991.
Art. 4º - Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
Sala das Sessões, 17 de fevereiro de 1999.
Deputado Elvino Bohn Gass-PT
J U S T I F I C A T I V A
"Nossos corpos, plantas e animais; nosso ar, água, terra e solo não são commodities, não são passíveis de patenteamento e não estão à venda. Quando um sistema de produção de alimentos viola os direitos dos cidadãos e a ordem natural dos ecossistemas do planeta é fundamental que nós, povos, façamos uso de nossa inalienável liberdade de corrigir tais abusos." (trecho da Declaração de Vancouver sobre a Industrialização e Globalização da Agricultura, maio/98).
O tema dos cultivos transgênicos se insinua, por parte daqueles que os defendem, como sendo o próximo e inevitável passo no processo de modernização da agricultura brasileira, capaz de colocar o país em lugar de ainda maior destaque no panorama mundial, especialmente no que se refere ao mercado internacional da soja.
Os cultivos transgênicos são resultado das modernas técnicas da engenharia genética, que permitem que genes sejam retirados de uma espécie e transferidos para outra. Esses genes "estrangeiros" quebram a seqüência de DNA - que contém as características básicas de um ser vivo do organismo receptor, que sofre uma espécie de reprogramação, tornando-se capaz de produzir novas substâncias. Esses são os chamados transgênicos, ou organismos geneticamente modificados (OGMs).
O principal risco da disseminação dos cultivos transgênicos está na distância que há entre a complexidade dos seres vivos e o patamar alcançado pelo conhecimento científico.
No caso da soja, por exemplo, os cientistas estudaram apenas 0,02% do que há para saber do genoma desse organismo, o que indica que, na manipulação genética que tem por objetivo conferir à planta a resistência ao herbicida Roundup é essa a única novidade da soja transgênica, a substituição de vários herbicidas por um único produzido pela Monsanto, não havendo qualquer ganho em produtividade da cultura ou no valor nutricional do grão, podem estar sendo modificadas outras características do organismo.
Foi o que aconteceu em 1989 no Japão, onde, para a produção de um suplemento alimentar, alterou-se geneticamente uma bactéria natural visando a produção mais eficiente de triptofano. A manipulação fez a bactéria produzir uma substância altamente tóxica, que só foi detectada quando o produto já estava no mercado. Adoeceram 5000 pessoas, 1500 se tornaram permanentemente inválidas e 37 morreram.
Entre as possíveis conseqüências dos cultivos transgênicos, estão o empobrecimento da biodiversidade, na medida em que essas plantas modificadas geneticamente podem interagir no meio ambiente com as variedades naturais; a eliminação de insetos e microrganismos benéficos ao equilíbrio ecológico; o aumento da contaminação dos solos e lençóis freáticos, devido ao uso intensificado de agrotóxicos e, ainda, o desenvolvimento de plantas e animais resistentes a uma ampla gama de antibióticos e agrotóxicos. Com relação à saúde humana, o aparecimento de alergias provocadas por alimentos geneticamente modificados; o aumento da resistência a antibióticos e o aparecimento de novos vírus, mediante a recombinação de vírus "engenheirados" com outros já existentes no meio ambiente.
É necessário ter claro que caso algumas dessas conseqüências negativas da engenharia genética ocorram, será impossível controlá-las, pois à diferença de poluentes químicos, os OGMs, por serem formas vivas, são capazes de sofrer mutações, se multiplicar e se disseminar no meio ambiente. Ou seja, uma vez aí introduzidos, não podem ser removidos.
Na Europa, pesquisas de opinião têm evidenciado a rejeição da população à produção e consumo de alimentos transgênicos. Em conseqüência, companhias produtoras de alimentos e redes de supermercado têm buscado fornecedores "OGM free" e governos, amparados no princípio de precaução que tem como elementos a precaução diante de incertezas científicas e o uso de processos democráticos na adesão e observação do princípio, inclusive o direito público ao consentimento informado, têm adotado medidas restritivas, como proibição do cultivo e obrigatoriedade de segregação e rotulagem dos alimentos transgênicos.
Enquanto isso, no Brasil, a CTNBio - Comissão Técnica Nacional de Bio segurança, órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia que tem a função de examinar a segurança dos organismos geneticamente modificados já deu, em pouco mais de dois anos, mais de 300 pareceres favoráveis à liberação de organismos geneticamente modificados no ambiente brasileiro. Aprovou, também, baseando sua análise exclusivamente na documentação fornecida pela própria Monsanto, a soja Roundup Ready, objeto do primeiro pedido para uso em escala comercial no País que apenas ainda não foi implantado porque o Ministério da Agricultura foi impedido de autorizá-lo por uma liminar concedida a entidades ambientalistas e de consumidores pela Justiça, liminar essa suspensa em 27 de novembro/98.
O caso da soja, apenas o primeiro, é exemplar para a compreensão do que está em jogo na disputa sobre os transgênicos, e do lugar do Brasil e do Rio Grande do Sul nessa disputa.
São três os grandes produtores mundiais de soja: EUA, Brasil e Argentina, que detêm 90% da produção mundial. O Brasil é, desses, o único em que a produção de soja geneticamente modificada ainda não foi implantada, sendo que 90% da produção brasileira tem como destino a Europa.
Para a Monsanto, a rápida aprovação da soja transgênica no Brasil é questão chave em sua estratégia mercadológica: somente assim conseguirá impor seu produto aos consumidores europeus. E uma vez quebrada a resistência através da soja, o caminho estaria livre para qualquer outro alimento modificado geneticamente.
O Rio Grande do Sul produz 22% da soja brasileira. Para nosso estado, a contaminação da produção pela soja transgênica significaria perda de biodiversidade, escravização dos agricultores às sementes de soja vendidas com exclusividade pela empresa e a desvalorização do nosso produto a tendência é que a soja convencional obtenha melhores preços no mercado internacional, havendo atualmente referências de preços até 50% maiores da soja convencional em relação à soja transgênica.
O Rio Grande do Sul já foi pioneiro no País com relação ao tema dos agrotóxicos. Cabe-nos, agora, defendendo os interesses dos cidadãos de nosso estado, consumidores e agricultores, impedir a produção e comercialização de alimentos contendo organismos geneticamente modificados em solo gaúcho. É o que propõe esse Projeto de Lei.
Sala das Sessões, 17 de fevereiro de 1999.
[1] Graduado do curso de Estudos Sociais – Habilitação em Geografia do Unilasalle
[2] Graduado do curso de Estudos Sociais – Habilitação em Geografia do Unilasalle
[3] Professora Mestra dos Cursos de Estudos Sociais e Geografia do Unilasalle
[4] OLIVEIRA, Fátima é médica; diretora da Rede Nacioanal Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos; integrante efetiva do Comitê de Especialistas em Bioética e Biodireito da Universidade de Alfenas (MG). Disponível on line: http://www.anbio.org.br/bio/biodir_art2.html. Acessado em 31/10/2003
[5] Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC). Disponível on line: http://www.consumidores.hpg.ig.com.br/reclame/decon_idec.html. Acessado em 05/10/2003
[6] Marina Paoli apud Romildo Lopes de Oliveira - Greenpeace Brasil Maio de 1999. Disponível on line:
http:// http://www.ufv.br/dbg/BIO240/t02.htm acessado em 10/10/2003
[7] Marina Paoli apud Romildo Lopes de Oliveira - Greenpeace Brasil Maio de 1999. Disponível on line:
http:// http://www.ufv.br/dbg/BIO240/t02.htm acessado em 10/10/2003
[8] Ana Lúcia Delgado Assad é economista, doutora em Política Científica e Tecnológica pela Unicamp, analista em C&T do CNPq.
Paulo José Péret de Sant' Ana é Economista, doutor em Engenharia de Produção pela COPPE/UFRJ, analista em C&T do CNPq.
Disponível on line: http://www.comciencia.br/reportagens/genetico/gen12.shtml, acessado em 25/10/2003
[9] Disponível on line: http://orbita.starmedia.com/~m.p.3/regulamentação.htm, acessado em 25/10/2003
acessado em 23/10/2003
